HUGO GROTIUS – EMMANUEL KANT – THOMAS HOBBES – JOHN LOCKE
Sob a denominação de teorias racionalistas, agrupam-se todas aquelas que justificam o Estado como de origem convencional, isto é, como PRODUTO DA RAZÃO HUMANA.
São as chamadas teorias contratualistas ou pactistas. Partem de um estudo das primitivas comunidades, em estado de natureza, e, através de uma concepção metafísica do direito natural, chegam à conclusão de que a SOCIEDADE CIVIL (o Estado organizado), nasceu de um acordo utilitário e consciente entre os indivíduos.
Essas teorias foram corporificadas e ganharam maiores evidências com a Reforma religiosa, a qual foi uma autêntica rebelião racionalista contra a Igreja Romana, que culminou com a revisão das Sagradas Escrituras. Fazendo coro com a filosofia de Descartes, delineada em “Discursos sobre o método”, filosofia esta que ensinou o raciocínio sistemático que conduz à dúvida completa, sustentou Lutero a supremacia da inteligência individual e pregou a liberdade de interpretação da lei religiosa revelada.
Depois de ter influído nas ciências econômicas, traçando-lhes novos rumos, o racionalismo religioso passou a orientar as ciências do Direito e do Estado. O homem, deveria duvidar de tudo, para reconstruir a verdade, liberada dos dogmas, valendo-se, para isso, da razão, da liberdade de consciência e da sua inteligência livre. E foi assim que as teorias tradicionais sustentadas pelas escolas teológicas foram argüidas de falsidade. O DIREITO DIVINO DOS REIS CEDEU LUGAR AO DIREITO HUMANO[4].
As teorias racionalistas de justificação do Estado, partindo de um pressuposto a respeito do homem primitivo em estado de natureza, entrosando-se com os princípios de direito natural. Como cada qual quisesse mandar e erigir-se em soberano, escolheu-se entre eles um certo número de magistrados, instituíram-se as leis, às quais os homens se submeteram voluntariamente[5]. É essa, aliás, uma das fontes da filosofia contratualista.
HUGO GROTIUS[6]
Holandês (1583-1647), foi precursor da doutrina do direito natural e, de certo modo, do racionalismo na ciência do Estado. Em sua famosa obra De Jure Belli et Pacis, esboçou a divisão dicotômica do Direito em positivo e natural[7]:
“…acima do direito positivo, contingente, variável, estabelecido pela vontade dos homens, existe um direito natural, imutável, absoluto, independente do tempo e do espaço, decorrente da própria natureza humana, alheio e superior à vontade do soberano.”
Hugo Grotius conceituou o Estado como:
“Uma sociedade perfeita de homens livres que tem por finalidade a regulamentação do direito e a consecução do bem-estar coletivo[8]”.
EMMANUEL KANT[9]
Kant, Hobbes, Puffendorf, Thomazius, Leibnitz, Wolf, Rousseau, Blackstone e outros gênios luminosos do século XVII desenvolveram essa doutrina dando-lhe magno esplendor[10].
Emmanuel Kant, o grande filósofo de Koenigsberg (1724-1804), doutrinou o seguinte:
“O homem reconhece que é a causa necessária e livre das suas ações (razão pura) e que deve obedecer a uma regra de comportamento pré-existente, ditada pela razão prática (imperativo categórico). O direito tem por fim garantir a liberdade, e por fundamento, um conceito geral, inato, inseparável do homem, fornecido a priori pela razão prática, sob a forma de um preceito absoluto: conduze-te de modo tal que a tua liberdade possa coexistir com a liberdade de todos e de cada um.[11]”
Conclui Kant que, ao saírem do estado de natureza para o de associação, submeteram-se os homens a uma limitação externa, livre e publicamente acordada, surgindo, assim, a autoridade civil, O ESTADO[12].
THOMAS HOBBES[13]
Filósofo inglês (1588-1679), o mais reputado dentre os escritores do século XVII, foi o primeiro sistematizador do contratualismo como teoria justificativa do Estado. É havido também como teórico do absolutismo. Seu absolutismo é racional e sua concepção do Estado tende a conformar-se com a natureza humana[14].
Para justificar o poder absoluto, Hobbes parte da descrição do estado de natureza:
“o homem não é naturalmente sociável como pretende a doutrina aristotélica. No estado de natureza o homem era inimigo feroz dos seus semelhantes. Cada um devia se defender contra a violência dos outros[15].”
Cada homem era um lobo para os outros homens – homo homini lúpus. Por todos os lados havia a guerra mútua, a luta de cada um contra todos – bellum omnium contra omnes[16].
E continua: Cada homem alimenta em si a ambição do poder, a tendência para o domínio sobre os outros homens, que só cessa com a morte. Só triunfam a força e a astúcia. E, para saírem desse estado caótico, todos os indivíduos teriam cedido os seus direitos a um homem ou a uma assembléia de homens, que personifica a coletividade e que assume o encargo de conter o estado de guerra mútua. A fórmula se resumiria no seguinte[17]:
Autorizo e transfiro a este homem ou assembléia de homens o meu direito de governar-me a mim mesmo, com a condição de que vós outros transfirais também a ele o vosso direito, e autorizeis todos os seus atos nas mesmas condições como o faço[18].
Ao se associarem, portanto, segundo Hobbes, procederam os homens por interesse e necessidade, reconhecendo a conveniência de se armar um poder forte, capaz de conter a fúria natural dos indivíduos[19]. Esse poder, em vista da missão que lhe cabe, há de ser irresistível e ilimitado.
Assim, a sociedade civil é um produto artificial de um pacto voluntário, que se explica pelo cálculo egoísta.
Embora teórico do absolutismo e partidário do regime monárquico, Hobbes, admitindo a alienação dos direitos individuais em favor de uma assembléia de homens, não afastou das suas cogitações a forma republicana[20].
Hobbes admitia a existência de Deus, mas atribuía ao Estado a regulamentação dos cultos: o domínio do poder coativo há de estender-se ao espírito, para que nenhuma ação do homem escape ao poder de dominação livremente instituído e destinado a reprimir os maus instintos naturais de cada um. E, para isso, o Estado deve governar também a Igreja. O reino de Deus, na terra, é um reino civil. Cada Estado é um imediato de Deus, sendo que Deus fala aos homens pela boca do Estado[21].
Em sua obra “Elements of natural and political law“ (1640) escreveu Hobbes:
“…considerando que a vontade de atacar é inata no homem; considerando que cada homem, atacando, está no seu direito, e o outro, resistindo, também está no seu direito; considerando que daí a desconfiança mútua está justificada e cada um medita sobre os meios de se defender, porque o Estado natural do homem é o estado de guerra…[22]“.
Em 1642 publicou o “De Cive” em latim, em defesa do absolutismo de Carlos I, e na sua velhice, publicou “História da guerra civil inglesa”.
Sua maior obra, porém, obra monumental que empolgou o mundo, foi “O Leviatã” (1651), escrita em inglês — “Leviathan, or the Matter, Form and Power of the Commonwealth, Eclesiastical and Civil”[23]
Distinguiu Hobbes, em “O Leviatã”, duas categorias de Estados: o Estado real, formado historicamente e baseado sobre as relações da força, e o Estado racional (Civitas institutiva), deduzido da razão.
O título do livro foi escolhido para mostrar a onipotência que o governo devia possuir[24]. O Leviatã é aquele peixe monstruoso de que fala a Bíblia, o qual, sendo o maior de todos os peixes, impedia os mais fortes de engolirem os menores[25]. O Leviatã está assentado no trono de Deus. Por isso mesmo, no frontispício do livro estão as palavras de Job, XLI, 25: “non estpotestas super terram quae comparetur ei”. O Estado (Leviatã) é o deus onipotente e mortal (The mortal God)[26].
JOHN LOCKE[27]
Filósofo inglês (1632-1704), desenvolveu o contratualismo em bases liberais, opondo-se ao absolutismo de Hobbes.
Foi Locke o vanguardeiro do liberalismo na Inglaterra. Em sua obra “Ensaio sobre o governo civil” (1690), em que faz a justificação doutrinária da revolução inglesa de 1688, desenvolve os seguintes princípios:
O homem não delegou ao Estado senão os poderes de regulamentação das relações externas na vida social, pois reservou para si uma parte de direitos que são indelegáveis. As liberdades fundamentais, o direito à vida, como todos os direitos inerentes à personalidade humana, são anteriores e superiores ao Estado.
Locke encara o governo como troca de serviços:
(1) os súditos obedecem e são protegidos;
(2) a autoridade dirige e promove justiça;
(3) o contrato é utilitário e sua moral é o bem comum.
No tocante à propriedade privada, afirma Locke que ela tem sua base no direito natural: o Estado não cria a propriedade, mas a reconhece e protege.
Pregou Locke a liberdade religiosa, sem dependência do Estado, embora tivesse recusado tolerância para com os ateus e combatido os católicos porque estes não toleravam as outras religiões.
Locke foi ainda o precursor da teoria dos três poderes fundamentais, desenvolvida posteriormente por Montesquieu.
Dentre as obras de John Locke, destacam-se, pela sua importância e larga influência no pensamento filosófico moderno[28]:
Cartas de tolerância,
Ensaios sobre o entendimento humano,
A racionabilidade do Cristianismo,
Tratado sobre governo e
Algumas reflexões sobre a educação.
Prosseguiremos, analisando a teoria contratualista, nos termos em que a colocou o gênio fulgurante de ROUSSEAU, que foi o dínamo propulsor da Revolução Francesa.
Continue suas leituras….
[4] (PDF) A origem do Estado na tradição Contratualista: Uma análise …, https://www.academia.edu/71115665/A_origem_do_Estado_na_tradi%C3%A7%C3%A3o_Contratualista_Uma_an%C3%A1lise_cr%C3%ADtica_das_discord%C3%A2ncias_entre_Thomas_Hobbes_e_John_Locke.
[5] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
[6] Hugo Grotius, Hugo de Groot, Huig de Groot ou Hugo Grócio foi um jurista a serviço da República dos Países Baixos. É considerado o fundador, junto com Francisco de Vitória e Alberico Gentili, do Direito internacional, baseando-se no Direito natural.
[7] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
[8] Teorias sobre a formação do estado – Cola da Web, https://www.coladaweb.com/direito/teorias-sobre-a-formacao-do-estado.
[9] Immanuel Kant ou Emanuel Kant, foi um filósofo alemão e um dos principais pensadores do Iluminismo. Seus abrangentes e sistemáticos trabalhos em epistemologia, metafísica, ética e estética tornaram-no uma das figuras mais influentes da filosofia ocidental moderna
[10] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
[11] Teorias sobre a formação do estado – Cola da Web, https://www.coladaweb.com/direito/teorias-sobre-a-formacao-do-estado.
[12] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
[13] Thomas Hobbes foi um matemático, teórico político, e filósofo inglês, autor de Leviatã e Do Cidadão. Na obra Leviatã, explanou os seus pontos de vista sobre a natureza humana e sobre a necessidade de um enorme governo e de uma enorme sociedade.
[14] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
[15] ESTADO Prof. Antonio Mateus Soares SOCIOLOGIA – ppt carregar – SlidePlayer, https://slideplayer.com.br/slide/367273.
[16] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
[17] TGE – Trabalho Justificação do Estado – Teoria Geral do Estado, https://www.passeidireto.com/arquivo/5490253/tge-trabalho-justificacao-do-estado.
[18] Escreva um texto sobre a relação entre pacto social e … – Brainly, https://brainly.com.br/tarefa/6919013.
[19] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
[20] TGE – Trabalho Justificação do Estado – Teoria Geral do Estado, https://www.passeidireto.com/arquivo/5490253/tge-trabalho-justificacao-do-estado.
[21] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
[22] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
[23] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
[24] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
[25] Teorias sobre a formação do estado – Cola da Web, https://www.coladaweb.com/direito/teorias-sobre-a-formacao-do-estado.
[26] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
[27] John Locke foi um filósofo inglês e ideólogo do liberalismo, sendo considerado o principal representante do empirismo britânico e um dos principais teóricos do contrato social.
[28] (PDF) XIII JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO -II – Academia.edu, https://www.academia.edu/40028867/XIII_JUSTIFICA%C3%87%C3%83O_DO_ESTADO_II.
Pesquisa e compilação – Prof. Artur Cristiano Arantes
Homepage – https://professorarturarantes.com/