A Importância da Disciplina de Medicina Legal no Curso de Direito

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RESUMO: Trata-se de apreciação sobre a importância do ensino de Medicina Legal nas Faculdades de Direito, com a finalidade de capacitar os futuros profissionais nas suas atividades no campo jurídico e da importância do preparo dos acadêmicos para um futuro de audiências, sejam elas penais ou civis, onde possam, em suas atividades jurídicas, demonstrar como advogados, promotores, delegados, juízes e outras, capacidade de interpretar documentos médico-legais.

Palavras chaves: Medicina Legal, Medicina Forense e Direito

INTRODUÇÃO

O presente artigo prende-se ao interesse de colaboração acadêmica no sentido de trazer informações de matéria tão pouco valorada presentemente, mas que, dada a sua importância, motivou o autor a este artigo acerca desta temática, no qual consiste em específica abordagem deste assunto e seus reflexos nas audiências dos futuros formandos em Direito, tanto nos fóruns criminal e civil. 

Assim, entendo ser oportuno descrever a “Importância do estudo da Medicina-Legal no Curso de Direito”, com a finalidade de capacitar os futuros profissionais nas suas atividades no campo jurídico. 

Nem de longe tem este modesto professor da área a pretensão de colocar em “xeque” pensamentos contrários à manutenção desta disciplina na grade curricular do Direito, porém entendendo ser de suma importância sua manutenção, expor sua opinião, pois crê que os acadêmicos terão uma melhor visão da realidade prática e criarão maior segurança para, nas audiências judiciais, com as interpretações dos laudos periciais, possibilitando-lhes a tomada de decisões que irão ajudá-los conseqüentemente na aplicação da justiça nos casos concretos.  

Assim, numa simbiose entre as Normas Legais do Direito em seus vários setores (como instrumentos de controle da conduta humana), donde se consumam os atos de violência ou agressões, principalmente elencados em alguns artigos do Código Penal, é que a Medicina-Legal vem a demonstrar as formas destes danos e suas conseqüências, para auxiliar os Operadores do Direito e Magistrados. De sorte que, o Acadêmico aprenderá noções de como os crimes são consumados, os meios utilizados nestes e as conseqüências dos instrumentos usados pelos agentes que figuram no setor da não juridicidade.

Com o crescimento da violência e da criminalidade, que, lamentavelmente, atinge nossa sociedade contemporânea, quer nas ruas ou nos lares, e ganhando espaço na mídia, a Medicina Legal assume maior importância na sociedade. Cada vez mais as autoridades de Justiça e Segurança vêm assegurando, à elaboração da prova técnica, um papel fundamental para os inquéritos e processos. Ao mesmo tempo, o avanço da ciência e da tecnologia tem sido vertiginoso, de forma a exigir, do profissional do Direito e do Perito Médico-Legal, um conhecimento sempre atualizado da área para que essa venha a acrescentar mais recursos na investigação pericial. Importante assinalar que ao médico legista cabe um viés diferente da Medicina tradicional: enquanto nesta o médico atua no sentido de assegurar a saúde à sociedade e ao indivíduo, quer na prevenção, no tratamento ou na reabilitação do doente (Médico que “cura”), na Medicina Legal ou Forense o profissional usa todo o conhecimento médico disponível no sentido de esclarecer aos órgãos de segurança e de Justiça fatos criminosos ou suspeitos que tenham vitimado o ser humano (Medico que “apura”).

METODOLOGIA

Tem por objeto este artigo alertar para a importância do ensino de Medicina Legal, ou Forense, nas Faculdades de Direito buscando recortes doutrinários de diversos autores renomados da área bem como reunir elementos de convencimento para justificar a afirmativa.

RESULTADO e DISCUSSÃO

Valor do estudo da Medicina Legal para o Direito

Antes de nos atermos ao tema devemos ressaltar que há várias denominações desta disciplina como: Medicina-Legal Forense (A. Paré); Questões Médico-Legais (P. Zacchias); Medicina Judiciária (Lacassagne); Medicina Judiciária ou dos Tribunais (Prunelle); Jurisprudência Médica (Alberti); Medicina Política (Marc); Medicina Forense (Sydney Smith); Antropologia Forense (Hebenstreit); Bioscopia Forense (Meyer); Medicina Forense Jurídica (sábios de Roma); e, ainda, Medicina Pericial; Medicina Criminal; Medicina da Lei; Biologia Legal; Medicina Crítica; Biologia Forense; Medicina Política e Social (França). Assim nos dizeres de Genival Veloso França, Trata-se de uma disciplina de amplas possibilidades e grande dimensão pelo fato de não se ater somente ao estudo da ciência hipocrática, mas de se constituir na soma de todas as especialidades médicas acrescidas de fragmentos de outras ciências acessórias, sobrelevando-se entre elas a ciência do Direito.  

Ainda, por se tratar de um breve artigo, nos limitaremos “recortar” as impressões de alguns renomados autores da área (cujas obras estão indicadas na bibliografia), no intuito de defender nossa tese inicial, assim é que, segundo o renomado Hélio Gomes, sendo o Direito uma ciência humana, é preciso, em primeiro lugar, que o profissional do Direito tenha bom conhecimento do que é o ser humano em sua totalidade (uma unidade bio-psico-social). Para isto, não é necessário que possua o saber de um profissional da área biomédica, mas tem que conhecer as bases daquela unidade. E a Medicina Legal lhe provê os elementos necessários a esta compreensão.  Na prática forense, muitas vezes terá que se deparar com casos em que certos conhecimentos da área médica serão indispensáveis para poder elaborar quesitos, saber quando apresentá-los e como tirar proveito da resposta dos peritos. No campo do direito penal, são inúmeras as situações que ilustram esta necessidade. Nos casos de aborto, por exemplo, deverá saber que há casos em que ocorre espontaneamente, sem ação criminosa.

Havendo suspeita de infanticídio, terá que saber o que é nascer com vida; do contrário aceitará a possibilidade do crime praticado contra um natimorto. E mais recentemente, nova confusão sobre a fase obstétrica puerperal e o conceito médico-legal de “influência do estado puerperal”, a que alude a lei, no infanticídio.

Precisará estar atento para os desvios de conduta dos psicopatas, sabendo que não são, na realidade, doentes mentais conforme requer o artigo 26 do Código Penal.

Ao ler um laudo cadavérico, ou de lesão corporal, poderá estabelecer associações entre as lesões e as alegações do indiciado. E assim por diante. No direito civil, ressaltam as causas de interdição, de anulação de casamento por impotência, de determinação de paternidade, em que far-se-á necessidade saber que tipos de exame poderá solicitar aos peritos de modo a esclarecer os fatos. Com um mínimo conhecimento de biologia, evitará formular quesitos impossíveis de serem respondidos.  Nas causas de acidentes de trabalho, terá que saber que há doenças que são típicas de certas profissões. 

Para, Francisco Silveira Benfica e Márcia Vaz, ao jurista é necessário seu estudo a fim de que saiba a avaliar os laudos que recebe, suas limitações, como e quando solicitá-los, além de estar capacitado a formular quesitos procedentes em relação aos casos em estudo. É imprescindível que tenha noções sobre como ocorrem as lesões corporais, as conseqüências delas decorrentes, as alterações relacionadas com a morte e os fenômenos cadavéricos, conceitos diferenciais em embriaguez e uso de drogas, as asfixias mecânicas e suas características, os crimes sexuais e sua análise pericial etc.

Para Delton Croce, a Medicina-Legal serve mais ao Direito, visando defender os interesses dos homens e da sociedade, do que à Medicina. A designação legal emprestada a essa ciência indica que ela se serve, no cumprimento de sua nobre missão, também das ciências jurídicas e sociais, com as quais guarda, portanto, íntimas relações. É a Medicina e o Direito completando-se mutuamente.

Nos ensinamentos de Luiz Carlos Leal Prestes Junior encontramos que a Medicina-Legal brasileira, muito influenciada pela Escola francesa, teve como vigas mestras as Faculdades de Medicina da Bahia e do Rio de Janeiro, em meados de 1832. Depois, com a criação do então Código de Processo Criminal e o ensino oficial da cadeira de Medicina-Legal passaram-se a estabelecer a perícia oficial, com regras jurídicas, modelos e quesitação oficial, utilizadas até hoje, encontradas no Código Penal, desde a sua criação em 1940.

Á partir daí foram galgados importantes avanços no desenvolvimento dos estudos das ciências forenses, sobretudo aqueles originados nas Escolas de Medicina da Bahia e do Rio de Janeiro, onde nomes como Raimundo Nina Rodrigues, Oscar Freire, Afrânio Peixoto, Flamínio Fávero entre outros contribuíram de forma marcante  no desenvolvimento da Medicina-Legal no Brasil.

Já a introdução do ensino médico-legal nos currículos de Direito teve sua proposta relatada por Rui Barbosa e aprovada na Câmara dos Deputados, após o que o Governo brasileiro determinou a criação da cátedra de Medicina-Legal nas Faculdades de Direito do país a partir de 1891. Ao longo de muitos anos foi Disciplina obrigatória nos cursos de Direito transparecendo a importância da matéria na formação dos profissionais, mormente àqueles que militam na esfera criminal.

A despeito da evolução das ciências forenses, que introduziram no século XXI, novos horizontes no contexto Jurídico, ressalto ainda a própria cobrança, da matéria, nos concursos, para aqueles que almejam a carreira Policial. Entretanto o Ministério da Educação, na contra-mão desta evolução, decidiu estabelecer a Medicina-Legal como disciplina optativa nos cursos de Direito, o que ensejou oportunidade àqueles menos sensíveis a uma formação ampla do Bacharel em Direito e mesmo por desinformação, a oportunidade de retirar tal Disciplina da grade curricular.

Ensinar Medicina-Legal, hoje, é uma árdua tarefa pois há necessidade de valorizar mais  a atividade docente e proporcionar meios para que esse ensino seja amplamente desenvolvido no Direito. Não podemos conceber que uma especialidade de tal relevância, não tenha cursos de especialização, mestrado e doutorado, privando com isso, uma melhor qualificação do corpo docente.

Ainda, segundo Delton Croce, sendo a Medicina Legal a única disciplina nas Faculdades de Direito que se relaciona com a Biologia, seu estudo se reveste de fundamental importância, pois ninguém ignora que os conhecimentos biológicos, médicos e para-médicos ampliam aos acadêmicos de direito a consciência universalista do homem e da gênese de suas ações, abrindo-lhe maiores perspectivas de percepção sobre seu semelhante e sobre si mesmo, já que o conceito de normalidade é sobremaneira vago: normal é o que funciona harmoniosamente e silenciosamente em sociedade. É o “conhece-te a ti mesmo” socrático, ao qual acrescentamos: por ti mesmo! A Medicina Legal é, portanto, verdadeiro elo de ligação entre o pensamento jurídico e a Biologia, ciência e arte cooperadora na elaboração e na aplicação das leis.

Aos juristas, autoridades policiais e advogados importa à Medicina Legal orientar com minudência, concisão e clareza sobre a realidade de um fato de natureza específica e caráter permanente que interessa à Justiça, e como pedir, o que pedir e o modo de interpretar os laudos periciais, para evitar que suceda o ocorrido com determinada Autoridade, que, segundo relatou o insigne professor Hélio Gomes, sabedor por informação pericial de que havia espermatozóides na macha da camisa de um suicida, solicitou ao Instituto Médico-Legal determinasse ser o gameta encontrado de homem ou de mulher!   

CONCLUSÃO

Poderíamos nos estender “ad eternum” sobre o tema, porém pelos recortes dos pensamentos dos renomados autores acima citados entendo que podemos concluir, fazendo minhas as palavras de Antonio Alves Madruga (Médico, Advogado e Catedrático), reafirmando que a Medicina Legal é freqüentemente usada na prática forense, pois com as perícias realizadas pelos médicos legistas têm um valor probante indiscutível no auxílio do direito processual pela busca da sentença justa, que tenha como fundamento a verdade dos fatos e suas circunstâncias.  

Assim, a verificação de lesões ou a necropsia; análise do estado mental do acusado ou a cessação da periculosidade, a conveniência de interdição dos toxicômanos ou a desinterdição dos doentes mentais recuperados, a incapacidade de alguém testar ou ser admitido como testemunha, constituem casos comuns. 

Portanto, a inclusão da disciplina Medicina Legal no curso de Direito é de extrema importância onde os acadêmicos são preparados para um futuro de audiências, sejam elas penais ou civis, onde possam demonstrar o seu aprendizado como advogados, promotores, delegados, juízes e outras atividades jurídicas, nas interpretações de documentos médico-legais, destacando-se os laudos periciais, pareceres e relatórios que terão que ser interpretados no dia-a-dia destes profissionais, resultando na veracidade ou não de um fato ilícito, condenando ou absolvendo agentes acusados ou indiciados.  

O Poder Judiciário, desde a fase de inquérito, indo para o setor processual e até no julgamento, necessita de provas estas realizar-se-ão com a colaboração dos peritos médicos legistas como auxiliadores da justiça. Bem utilizados tempestivamente anexados aos processos, os documentos médico-legais esclarecem e auxiliam eficazmente a distribuição da Justiça.

Não podemos concordar em opção (Disciplina opcional) quando falamos da Disciplina Medicina Legal no curso de Direito, pois isto é o maior absurdo, mais que isso, é um equívoco. O que será dos acadêmicos de Direito em seu futuro, nas audiências quando se defrontarem com laudos e mais laudos periciais sem saber interpretá-los; sem noções do que sejam lesões corporais e instrumentos causadores das mesmas; como elaborar os quesitos e interpretá-los quando forem delineados pelos médicos legistas; como ir para um Tribunal de Júri sem a mínima condição de defender ou acusar alguém de um delito sem o auxílio da disciplina Medicina Forense que tanto ajuda os elementos que fazem parte do Poder Judiciário que traz a tona às verdades dos fatos.

A sua importância já referida por vários mestres na matéria faz-nos pensar o contrário na retirada da disciplina Medicina Legal das Universidades de Direito no nosso País. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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  • XAVIER FILHO, Ernesto de Freitas. Rotina Médico Legal. Porto Alegre/RS: Sagra Luzzatto, 1992. 

_____________________________

Prof. ARANTES, A. C.

Advogado, Cirurgião-Dentista, Professor de Medicina Legal em Graduação do Unipinhal, do IIES-UNIP e

Unisal-Americana em extensão.

Fundação Pinhalense de Ensino – Av. Hélio Vergueiro Leite s/n – Espírito Santo do Pinhal-SP

prof.arturcristiano@gmail.com   –   ac.arantes.advocacia@gmail.com

Professor Artur Arantes

Com mais de 20 anos de dedicação ao ensino, Prof. Artur Cristiano Arantes é referência para alunos que desejam aprofundar seus conhecimentos em áreas fundamentais do Direito.

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